A história do ensino jurídico no Brasil
Em 1827, teve início a história formal do ensino jurídico no Brasil, com a edição do decreto que criou os cursos de direito em São Paulo e em Olinda (PE), a partir da Lei de 11 de agosto de 1827. Essa história, no entanto, remonta há cinco anos antes. Após a Independência do Brasil, em 1822, foi promulgada a primeira Constituição Federal do Brasil, de 1824. Dom Pedro I, no entanto, considerava que faltavam brasileiros com conhecimento jurídico e viu a necessidade de implantar o primeiro curso de direito no país.
A criação dos cursos jurídicos esteve ligada ao processo de consolidação da Independência e de construção do Estado nacional brasileiro, marcado, entre outros aspectos, pela produção de um aparato legislativo que fundaria uma cultura jurídica própria, distinta do arcabouço legal herdado da metrópole portuguesa.
Até então, a maioria dos bacharéis em direito, juristas e advogados no Brasil era formada pela Universidade de Coimbra, em Portugal. Antes do imperador, portanto, os estudantes brasileiros daquela faculdade passaram a reivindicar a criação de um curso em terras brasileiras. O pedido foi levado em conta na Assembléia Constituinte de 14 de junho de 1823, pelo deputado José Feliciano Fernandes Pinheiro, futuro visconde de São Leopoldo.
Após a apresentação e discussão de diversas propostas, a Assembléia Constituinte aprovou, em 4 de novembro do mesmo ano, projeto de lei criando duas universidades, uma em São Paulo e outra em Olinda. Entretanto, D. Pedro I dissolveu a Assembléia sem ter sancionado o projeto, frustrando a primeira tentativa de criação dos cursos jurídicos no Brasil.
Por decreto expedido em 9 de janeiro de 1825, o imperador criou provisoriamente um curso jurídico na cidade do Rio de Janeiro, regulado pelos estatutos redigidos por Luís José de Carvalho e Melo, visconde da Cachoeira. O decreto não teve execução e o curso não chegou a ser instituído.
Finalmente, em 11 de agosto de 1827, D. Pedro I sancionou e promulgou a lei que criava os dois primeiros cursos de ciências jurídicas e sociais. O artigo 10 dispunha que os Estatutos do Visconde da Cachoeira regulariam os cursos jurídicos até que outros fossem aprovados, o que ocorreu quando o decreto de 7 de novembro de 1831 estabeleceu novos estatutos, adaptados à metodologia e ao currículo definidos pela referida lei.
Promulgada em diversas épocas da História do Brasil, essa legislação teve por finalidade promover a estruturação dos cursos jurídicos – mais tarde chamados faculdades de Direito – em um modelo ideal, que atendesse às necessidades e anseios de um país em constante transformação.
Os antigos mosteiros e conventos foram de grande importância para a instalação dos primeiros cursos jurídicos no Brasil. Com efeito, pelo porte de suas edificações, pelo valor das bibliotecas e pelo saber dos monges, eram os locais mais indicados para abrigar, com economia para os cofres do Império, os centros de ensino superior criados pela Lei de 11 de agosto de 1827.
Mas o funcionamento inicial dos cursos jurídicos em São Paulo e Olinda foi bastante precário. Instalados, respectivamente, nos conventos de São Francisco e São Bento, as dificuldades enfrentadas eram de várias ordens, como a inadequação dos prédios, disciplinas pouco ajustadas à demanda legislativa após a Independência, descontentamento com a qualidade e assiduidade dos professores e permanente conflito com os alunos. Essa conjuntura não favoreceu a formação de uma cultura jurídica própria.
São Paulo
A Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP) é hoje reconhecida nacional e internacionalmente pela sua excelência. Nem sempre foi assim. No século 19, houve um breve período em que se chegou a pensar em fechá-la. Há décadas, no entanto, é referência. A FDUSP é grande em história, relevância, e em números: oferece 460 vagas por ano. O tamanho do corpo discente não impede o ensino de qualidade.
Desde o início, a Academia de Direito paulista foi instalada no Largo de São Francisco, no velho convento do século XVI e cujas respectivas igrejas ainda existem. O edifício, hoje tombado como patrimônio histórico do Estado de São Paulo, abriga importante acervo cultural: ele próprio tem elementos como os vitrais da escadaria, produzidos pela Casa Conrado Sorgenicht, e o mobiliário do Salão Nobre e da Sala da Congregação. Pinturas e esculturas de artistas renomados estão pela faculdade homenageando velhos e inspiradores mestres. A Biblioteca, que em 1825, já contava com acervo reunido de longa data pelos frades franciscanos, tornou-se a primeira biblioteca pública de São Paulo, antes mesmo da inauguração da Faculdade.
Recife
A Faculdade de Direito do Recife teve como sua primeira sede o Mosteiro de São Bento, em Olinda. Em 1854, foi transferida para a capital, incorporando-se à Universidade do Recife em 1946, ano de surgimento da Universidade Federal de Pernambuco. O curso funciona no palácio histórico da Faculdade de Direito do Recife, prédio tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, na Praça Adolfo Cirne, no centro do Recife.
Com a criação da UFPE, a faculdade adotou o título de Centro de Ciências Jurídicas (CCJ) e ocupa uma área de 3,6 mil m2, abrigando uma tradicional e valiosa biblioteca com mais de 100 mil títulos. Além do prédio do palácio histórico, a Faculdade de Direito do Recife também ocupa o prédio da Pós-Graduação, na Rua do Hospício. nº 371, atrás da antiga Escola de Engenharia, e do Anexo conhecido como DEMEC, também na Rua do Hospício, nº 619.
Outros centros
Mais tarde, outras cidades e regiões construíram os próprios cursos de direito. Em 18 de abril de 1882, por iniciativa de Fernando Mendes de Almeida, foi criada a Faculdade Livre de Ciências Jurídicas e Sociais do Rio de Janeiro, que, no entanto, só funcionaria a partir de 19 de maio de 1891, após a implementação da Reforma Benjamin Constant, que estabeleceu efetivamente a liberdade de ensino no Brasil. Ela foi fundida à Faculdade Livre de Direito da Capital Federal e, anos depois e depois de algumas transformações, ocupou o antigo solar do conde dos Arcos, na Rua Moncorvo Filho, onde permanece até hoje e integra a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Em matéria de história longa, o curso de direito da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) tem o que contar: foi criado em 17 de janeiro de 1909, por inspiração de um grupo de idealistas, sócios do Clube da Guarda Nacional. Assim, em sessão ocorrida naquela associação, nasceu a então “Escola Universitária Livre de Manaós”. Muitos cursos faliram depois do ciclo da borracha, o único que permaneceu ativo foi o de direito. Em 1964, quando foi criada a Zona Franca de Manaus, a faculdade de direito passou a fazer parte da universidade.
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